Na porta do meu frigorífico estão penduradas três listas de regras: uma descreve em pormenor tudo o que é proibido fazer, outra é exclusivamente dedicada aos deveres e a última enumera os direitos da criançada. Este processo legislativo doméstico foi uma iniciativa das bases, ou seja, dos meus filhos. Eles próprios queriam ver escrito o que não podem fazer porque se estava a tornar cada dia mais difícil decorar tantas regras e limitações, como gritar, pôr os pés em cima dos sofás, bater nos mais novos, comer na sala, etc. O básico.
Mas as coisas não correram muito bem: eles exageraram na febre normativa e o resultado desta lista foi uma espécie de código penal da Birmânia em versão doméstica e familiar. Paciência, digo eu. E cumpra-se.
Aproveitei a boleia e ditei os deveres: saiu uma listinha pindérica onde se diz que suas excelências têm de arrumar os brinquedos, ajudar a levantar os pratos da mesa, despejar o lixo, estudar - enfim, o mínimo.
No entanto, depois de expostas as listas, achei que o frigorífico mais parecia o "Mein Kampf", na exacta a medida em que um frigorífico pode ser comparado com o "Mein Kampf", e resolvi criar uma lista de direitos. Sim, de direitos das crianças. Mas não me lembrei de nenhum, além dos básicos da ONU, e convoquei uma assembleia doméstica para receber contributos. "Ver televisão", disse um deles. "OK", disse eu, "mas só quando eu deixar, está bem?" Eles concordaram. E assim chegámos a um entendimento, uma espécie de estatuto que está entre o democrático e a minha autoridade. Acho que vou enviar o meu frigorífico ao Ministério da Educação.
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